Falar de si mesmo nunca foi tarefa fácil. Definir-se, "traduzir-se", como diz o poeta, pertence ao universo abstrato da subjetividade. O poema a seguir é uma dessas tentativas, de rara beleza. Boa leitura!
TRADUZIR-SE
Uma parte de mim
é todo mundo
outra parte é ninguém
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pensa, pondera
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem
outra parte,
linguagem.
Traduzir uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?
(GULLAR, Ferreira. Toda poesia. 9 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000)
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